"Os intelectuais e o poder", a representação, a teoria e a prática

15:39


A 2 de Março de 1972, conversavam Michel Foucault e Giles Deleuze sobre o papel dos intelectuais:

«M. F. : [...] o que os intelectuais descobriram recentemente é que as massas não necessitam deles para saber; elas sabem perfeitamente, claramente, muito melhor do que eles; e elas o dizem muito bem. Mas existe um sistema de poder que barra, proíbe, invalida esse discurso e esse saber. Poder que não se encontra somente nas instâncias superiores da censura, mas que penetra muito profundamente, muito sutilmente em toda a trama da sociedade. Os próprios intelectuais fazem parte desse sistema de poder, a idéia de que eles são os agentes da "consciência" e do discurso também faz parte desse sistema. O papel do intelectual não é mais o de se colocar "um pouco na frente ou um pouco de lado" para dizer a muda verdade de todos; é antes o de lutar contra as formas de poder exactamente onde ele é, ao mesmo tempo, o objeto e o instrumento: na ordem do saber, da "verdade", da "consciência", do discurso.

É por isso que a teoria não expressará, não traduzirá uma prática; ela é uma prática. Mas local e regional [...], não totalizadora. [...] Luta não para uma "tomada de consciência" (há muito tempo que a consciência como saber está adquirida pelas massas [...] ), mas para a destruição progressiva e a tomada do poder ao lado de todos aqueles que lutam por ela, e não na retaguarda, para esclarecê-los. Uma "teoria" é o sistema regional desta luta.
G. D. : Exactamente. Uma teoria é como uma caixa de ferramentas [...]. É preciso que sirva, é preciso que funcione. E não para si mesma. Se não há pessoas para utilizá-la, a começar pelo teórico que deixa então de ser teórico, ela não vale nada ou que o momento ainda não chegou. Não se refaz uma teoria, fazem-se outras; há outras a serem feitas [...]. A teoria não totaliza; a teoria se multiplica e multiplica. [...] A meu ver, você foi o primeiro a nos ensinar - tanto em seus livros quanto no domínio da prática - algo de fundamental: a indignidade de falar pelos outros. Quero dizer que se ridicularizava a representação, dizia-se que ela tinha acabado, mas não se tirava a conseqüência desta conversão "teórica", isto é, que a teoria exigia que as pessoas a quem ela concerne falassem por elas próprias.» Foucault (1979: 71, 72) (sublinhado meu)


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Referência bibliográfica: Michel FOUCAULT (1979), "Os Intelectuais e o Poder", Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Edições Graal. 20ª edição, 2004

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