Discursos neutros e objectividade

12:06

A propósito do post "Oxigénio" de Rui Tavares, acerca da objectividade do jornalismo e da necessidade das vozes alternativas, que são fornecidadas pelos blogs e outras modalidades, pareceu-me pertinente inserir aqui um excerto dum artigo da revista Courrier Internacional (versão portuguesa) de Julho de 2009, de Andeï Arkhangelski, cronista russo, sobre, precisamente, a subjectividade na imprensa:
"A coisa mais importante que os jornalistas devem à sociedade é a verdade que, como a consciência, não pertence à categoria das noções objectivas. [...] A verdade não é a mesma para todos, mas, se não houver o desejo de trasnmitir a sua própria verdade, nenhuma verdade é possível. [...] o jornalismo de autor é o mais objectivo de todos. Só posso basear-me na opinião de um jornalista que não esconda a sua subjectividade. A principal garantia da independ~encia da imprensa é o compromisso dos seus actores, os jornalistas [...]." (p. 114)
Sobre esta assunto tinha já deixado um post com um comentário muito interessante de José Rebelo (José REBELO 2000. O discurso do jornal. Lisboa: Editorial Notícias) que trata destas questões com pormenor. Há um comentário específico que defende, precisamente, que quanto mais o sujeito se mostra no discurso, mais esse discurso se torna transparente, quanto mais ele se retira, mais o discurso se torna opaco - e opaco não significa neutro:
"Se nos situarmos [...] no eixo da dictização, o grau máximo de transparência, ou o grau mínimo de opacidade, corresponde [...] à presença máxima do sujeito da enunciação ou das suas marcas. À medida que o sujeito se retira, que desinveste, diminui a transparência do enunciado. E aumenta a sua opacidade [...]" (p. 75).
E este argumento não serve só para o discurso do jornal, serve também para o discurso científico:
"Casos há em que o discurso ideológico, produzido por um dado enunciador, se caracteriza, sobretudo, pelo apagamento deste e pela prioridade concedida ao objecto. Neste segundo caso, o discurso ideológico como que se confunde com o discurso científico." (p. 77)
Quanto mais neutro um discurso se mostra, menos transparente ele se torna, com todas as implicações que isso traz.
Talvez seja necessário rever a questão da neutralidade no jornalismo.

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